Media Watch

Um olhar sobre o que se vai passando com os media

18 dezembro 2006

Quando o filósofo francês Diderot publicou a Enciclopédia, no século XVIII, procurava ao mesmo tempo construir uma ferramenta de divulgação do saber e um armazém no qual fosse possível sistematizar todo o conhecimento da humanidade.
Dois séculos e meio depois, existe uma ferramenta electrónica, a Wikipédia, que nos pede apenas alguns segundos para sabermos em que anos foi publicada a obra dirigida por Diderot e quantos volumes, artigos ou assinantes possuía. No entanto, a enciclopédia online do século XXI não goza de prestígio igual ao das enciclopédias impressas em livro. Diz--se que é pouco fiável, quando, nas predecessoras, o erro é excepção rara. Contesta-se que possa ser editada por qualquer um e não por Voltaire ou Rousseau, como a enciclopédia original. Esses argumentos são verdadeiros mas passam ao lado do essencial.
Para o bem e para o mal, a Wikipédia não é uma enciclopédia impressa, mas uma enciclopédia electrónica. É certo que a tecnologia não muda a natureza do conhecimento - não existe um Leonardo da Vinci online e um Leonardo da Vinci offline. Mas a tecnologia altera o modo como usamos o conhecimento. E isso faz toda a diferença. A Wikipédia obedece a regras editoriais próprias da Internet que são distintas das da imprensa. Falar dessa especificidade de pouco serve, se estão em causa erros ou imprecisões. Mas é indispensável se quisermos compreender este fenómeno. E, no essencial, a principal diferença é esta: enquanto a enciclopédia clássica visa uma impossibilidade, reunir todo o conhecimento existente, a enciclopédia electrónica funciona não como um fim mas sim como um processo.
Mesmo a mais sagrada das enciclopédias é obrigada a um trabalho de actualização, através de edições anuais. Na Internet não existem "edições", mas sim uma emissão permanente. O conhecimento não é actualizado de ano para ano, mas de um minuto para o outro, em tempo real. E sem fronteiras físicas. Não se lhe pode exigir o mesm o rigor que a outras. Mas funciona como processo, isto é, lugar de passagem cuja base é a hiperligação, ou seja, a possibilidade de estabelecermos inúmeras associações a partir de um elemento dado. A Wikipédia pode não ter sempre a certeza, mas é certo que representa uma transformação profunda.
Diderot não a desdenharia.

Fonte: DN online
Recolha e Postagem: JMurta